Um dos seus empregados propôs um método que deu origem à rémuage, hoje integrada ao méthode champenoise.

Outro personagem importante para a história do champanhe se chamava Nicole-Barbe Ponsardin, que se casou com um produtor de champanhes no final do século XVIII. Com apenas seis anos de casada e 27 de idade, Nicole-Barbe perdeu seu marido e decidiu assumir a administração do negócio de champanhes sozinha, contrariando a tradição e sem o apoio da família Clicquot, da qual “a viúva” herdara seu nome. Assim nascia a Maison Veuve Clicquot, uma das marcas de champanhe mais consagradas do mundo, que teve uma contribuição efetiva não apenas para a internacionalização da bebida, mas também para a evolução da metodologia champenoise.

A visão comercial da Mme Clicquot fez com que ela tecesse estratégias de conquista do mercado russo, a despeito das rivalidades políticas. A Rússia saíra vitoriosa quando invadida por Napoleão em 1811 e, em 1814, contra-atacou a França, ocupando Reims e Epernay por certo período. A viúva Clicquot franqueou suas adegas aos soldados russos, pois sabia da potencialidade deste mercado. Seguinte ao retorno das tropas, enviou à Rússia, pelas mãos de um habilidoso comerciante, todo o estoque de champanhes que restara da esplêndida safra de 1811 e ganhou aquele mercado, sem concorrência à época.

Alguns aspectos da qualidade do produto ajudaram essa conquista dos consumidores: a extrema doçura do Champagne Clicquot, apreciada pelos russos, e a sua notável limpidez, fruto do desenvolvimento de técnicas mais eficazes para solucionar o problema da clarificação do vinho.

Como eu dizia no artigo anterior, a efervescência do champanhe se dava devido à re-fermentação espontânea dos vinhos, assim que as temperaturas locais aumentavam. Uma vez descoberto isso, passou-se a provocar a segunda fermentação pela adição de leveduras aos vinhos já prontos. A efervescência era garantida, mas, uma vez consumido o açúcar, as leveduras morriam, gerando borras que deixavam a bebida com aparência turva.

Para ajudar a remover os sedimentos, periodicamente, as garrafas eram sacudidas, de modo a concentrar as borras junto às suas paredes. Posteriormente, o líquido, mais límpido, era transvasado (trasfega) para outra garrafa de champanhe. Uma operação complexa, demorada, menos eficiente na limpidez e que provocava grande perda de efervescência.

Foi Antoine Müller, chef de cave recrutado pela viúva Clicquot que propôs um método melhor, dando origem à rémuage, hoje integrada ao méthode champenoise. Mantendo-se a garrafa emborcada, os sedimentos concentravam-se sobre a rolha, já na porta de saída da garrafa. A perda de efervescência era menor, facilmente complementada com o licor de expedição (liqueur de dosage) e a inserção de nova rolha.

A técnica foi aprimorada e, até 1821, era “o segredo” da limpidez dos Champagnes da Veuve Clicquot, única empresa a praticá-la. O método rémuage foi fundamental para aumentar a escala de produção do champanhe. Outros problemas ainda buscavam solução, como a explosão das garrafas, que demandou um aperfeiçoamento das vidrarias e uma maior precisão do cálculo do açúcar introduzido para induzir a segunda fermentação. Até a invenção do sucre-oenomètre, um medidor do conteúdo de açúcar, inventado em 1836, este era medido de forma aleatória e gerava muita pressão e, consequentemente, explosões.

Por muito tempo o champanhe era dulcíssimo e quem mudou este perfil foi o mercado consumidor inglês, já na segunda metade do século XIX. A empresa Veuve Clicquot só chegou a produzir seu Champagne Brut após a morte de sua “grande dame”.

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