A preciosa categoria de vinhos brancos ainda é ofuscada pelo entendimento de que vinho bom é vinho tinto, mas eu acredito veementemente que isso deve mudar, à medida que as pessoas enriqueçam a sua cultura de vinho e encontrem nos brancos uma melhor opção para beber vinho de qualidade, se refrescando. Um verão como o atual fica bem melhor se acompanhado de uma taça de vinho branco fresco!

Neste artigo, falo um pouco mais sobre a Chenin Blanc, de sua presença em outros territórios além do Vale do Loire. Se nos pautássemos pelo que existe na região onde a Chenin Blanc reina e gera vinhos de reconhecida qualidade, nos perguntaríamos por que ela não se tornou uma das mais produzidas uvas brancas do mundo. Há algo intrigante nessa adaptabilidade, que só se entende pelo reconhecimento de que há dificuldades na condução de seu vinhedo, quando o objetivo é alcançar sua melhor expressão. Vulnerabilidades já compreendidas pelo savoir-faire dos produtores que aprenderam desde cedo a lidar com a Chenin no Vale do Loire.

Em primeiro lugar, o seu perfil de brotação precoce e amadurecimento tardio, bem como a sua sensibilidade à umidade, nos leva a pensar que esta seria uma cepa mais adaptada a climas mais quentes e secos, contrariando o que predomina em sua região de origem. Há sim uma relativa presença da Chenin Blanc no sul da França, mas nada digno de nota. Ela também não está presente em outros países da região mediterrânea europeia e em muitas áreas vitivinícolas mais quentes do Novo Mundo. A exceção se dá na África do Sul, líder absoluto de produção da Chenin Blanc mundialmente: mais de 50% dos vinhedos desta variedade estão lá e, como se não bastasse, ela também é a cepa mais plantada do país.

O problema é que, apesar de não estar ameaçada por questões climáticas nessas regiões de climas quentes e secos, a Chenin se torna muito vigorosa nesses locais, podendo gerar um suco diluído sem grande expressividade. Parte da sua imensa presença histórica na África do Sul tem a ver com esse perfil rentável, quantitativo, que já não faz mais sentido no momento em que as vinícolas buscam se destacar mais pela qualidade e produtos premium. Desse modo, talvez a abordagem predominante da Chenin em outras regiões ainda seja na composição de vinhos de quantidade, nem sempre varietais e muitas vezes na destilação, como ocorre na Africa do Sul, onde também é utilizada para a produção de conhaques.

Outro aspecto mais questionável da cepa quanto ao quesito qualitativo está no fato de não se apresentar muito aromática em vinhos jovens, ou seja, ela tem acidez notável e, se for controlada em sua produtividade, pode criar condições de boa evolução, mas isso pode requerer certo tempo em garrafa, para que os seus aromas mais exuberantes, de frutas secas e mel, apareçam e façam jus à fama que os seus melhores vinhos do Loire criaram.

Sendo assim, há desafios para o seu cultivo em clima frio ou quente. Há que se evitar sua tendência vigorosa e buscar adaptações que forcem a concentração. Em bons resultados, é preciso paciência para ver o vinho da Chenin se apresentar em sua melhor forma. Até mesmo o trabalho muitas vezes utilizado na vinificação para a criação de vinhos brancos com mais volume em boca e impacto aromático, como a fermentação malolática, o uso de barricas e o amadurecimento sobre borras deve ser feito com parcimônia, já que ela apresenta certa tendência à oxidação.

Mas dado os bons resultados que podem ser obtidos, produtores mais obstinados em fazer produtores premium investem na cepa de forma diferenciada. Pude constatar bons resultados em vinhos do Sudoeste da França e do Languedoc. Na África do Sul, onde a uva está plantada desde 1655, foi criada uma associação de produtores, com o objetivo de reunir esforços visando abordagens mais apropriadas de desenvolvimento da cepa no país. A Chenin Blanc Association inclui várias iniciativas, como desenvolvimento de pesquisas que deem suporte aos avanços produtivos, realização de concursos com premiações anuais aos melhores vinhos da Chenin, promoção de eventos voltados à difusão da uva junto aos consumidores.

No mais, há boa inserção da Chenin na Califórnia, um pouco na Austrália e tenho visto a sua chegada na América. Fico torcendo pelas boas surpresas, que justifiquem mais vinhos brancos em nossas taças!

Deixe um comentário