Há uma identidade de grupo que se constrói pela troca de referências sobre o produto.

A cada ano nos deparamos com mais ofertas de eventos relacionados a vinhos, mesmo com a crise econômica, a desvalorização do real, a concorrência das cervejas artesanais e dos Gin tônicas como opções de bebidas especiais, entre outros. Isso nos leva a pensar que existe uma ampliação da cultura de consumo de vinhos no país para além dos territórios antes mais usuais: elite, público masculino e mais velho.

Além da ampliação do varejo que inclui o vinho (supermercados, bares e cafés), os eventos voltados para o tema são importantes meios de cultivar o interesse pelo consumo, não apenas pela oportunidade de se beber vinhos, mas porque há muita variedade de produtos no mercado atual. Outro ponto interessante é que há uma identidade de grupo que se constrói pela troca de referências sobre o produto.

Esta tendência é francamente perceptível no fenômeno de formação de confrarias – grupos de pessoas que criaram um elo, estimulado por experiências com o vinho (como a participação em algum curso ou evento de vinhos) e que criam uma agenda própria de encontros de degustação para a manutenção dessa relação de troca que une conhecimento e prazer.

A frequência da agenda de eventos sugere um aumento nas estatísticas de consumo de vinhos no Brasil. Infelizmente, nunca conseguimos ultrapassar uma taxa anual de consumo per capita em torno de 2 litros, e o que ocorre é uma diferença de natureza dos números apontados antes e agora. Até metade dos anos 1990, predominava o consumo de vinhos brasileiros feitos de uvas americanas (o famoso vinho de garrafão) ou de marcas importadas bem comerciais – vinhos mais baratos e consumidos em maior quantidade.

Hoje, este consumo ainda é predominante, mas, paulatinamente, muitas pessoas migram para o consumo de vinhos de uvas viníferas mais caros, de melhor qualidade e bebidos em menor quantidade. Este vinho que ostenta a sua qualidade pelas notas de críticos, descrições sensoriais, indicações de especialistas é um vinho que chama atenção, tem glamour, mas é bebido em menor quantidade do que as bebidas de massa.

Em relação aos eventos, tradicionalmente, predominam no mundo inteiro as grandes feiras de produtores, onde há uma apresentação de alguns vinhos pelas vinícolas, a partir de um recorte regional (por país ou região) ou mercadológico (vinhos de um grande importador, por exemplo). Os produtores ou representantes dão provas de seus vinhos em stands para profissionais da imprensa, possíveis distribuidores e público consumidor, que paga uma entrada para degustar os vinhos.

Isso vem ocorrendo com mais frequência no Brasil, especialmente por parte dos importadores. Nesse formato, podemos citar alguns eventos anuais que acontecem nas principais capitais do país: Encontro Mistral, Grand Cru Tasting, Cantu Day, Decanter Wine Day, Vinhos de Portugal, Vinhos do Brasil, Wines of Chile on the Road.

Percebe-se, contudo, uma diversificação dos formatos de eventos oferecidos: palestras, pequenas degustações, jantares harmonizados, vinhos no shopping, no mercado, na praia. Como o conhecimento de dados como solos, clima e métodos de produção é uma chave para a melhor apreciação dos produtos, as palestras de profissionais do setor, seguidas de degustação (comumente anunciadas como Master Class), atraem muita gente.

Há grandes festivais que se estendem por uma a duas semanas com uma multiagenda, envolvendo cursos, degustações, entretenimento, jantares. É o caso do Rio Wine & Food Festival, de 10 dias, e que tem várias atrações, e da Avaliação Nacional de Vinhos, que acontece anualmente em Bento Gonçalves e hoje faz parte de um evento maior, o Wine South America.

A Avaliação Nacional é uma degustação gigante dos vinhos brasileiros da nova safra – uma experiência única que leva muita gente à região e fomenta uma série de eventos aliados ao enoturismo na Serra Gaúcha. A gastronomia também sempre teve o vinho como grande aliado – onde tem comida gourmet tem vinho, e o evento mais emblemático dessa aliança é o Rio Gastronomia, que já faz parte da agenda anual carioca.

Muitos eventos são fundamentais para o networking e visam mais os profissionais da área do que o público consumidor. Por muito tempo, o mais significativo deles foi a Expovinis, que teve mais de 20 edições em São Paulo e, nos últimos anos, foi perdendo a expressividade, até ser cancelada em 2018. Em seu lugar, foi criada uma feira de formato similar, a Provino, que estreou em São Paulo em outubro de 2019.

Em épocas de crise, produtos caros e menos necessários, como o vinho, são os primeiros a serem cortados e desafiam o segmento na criação de motivos para seduzir o consumidor. Talvez este seja um dos motivos a explicar a multiplicação de oportunidades para entretê-lo. Na próxima coluna, vou apresentar com mais detalhes as novidades de alguns eventos, incluindo a sugestão de vinhos interessantes apresentados em cada um deles.

Para saber mais sobre grupos de estudos sobre vinhos e turmas abertas da Cafa Wine School no Brasil, visite miriamaguiar.com.br / Instagram: @miriamaguiar.vinhos

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